quinta-feira, 11 de abril de 2013

A TÁTICA DO TEJUAÇU (David de Medeiros Leite)



Daisy Droplets - aussiegall



Mossoró, para mim, é simples e familiar. É, no final da tarde, tomar a saborosa sopa de dona Hilda, em meio a fraternas reuniões. É participar do papo na calçada de Anchieta Alves, para ouvir a poesia de Luiz Sobrinho ou a circunspecta análise de Paulo Fernandes sobre os acontecimentos do dia, invariavelmente corroborada pelas opiniões de Chico Targino, João Duarte, Chico Pinto, Francisco Andrade, entre outros.

É tomar um bom vinho na casa de André Luís e Patrícia, com direito a um suave violão. É encontrar, na livraria Café & Cultura, Clauder Arcanjo, Chico Rodrigues e Marcos Ferreira e logo formar uma espécie de “sarau das letras”. É ir até a residência de Milton Marques para, em um daqueles amplos terraços, falar de nossas preocupações e sonhos com a Universidade.

É passear pelo centro da cidade, tomar um refresco na lanchonete de Chico Camilo e entrar em A Construtora para alguns minutos de prosa com Genivan Josué Batista. É encontrar-me com baluartes do Instituto Cultural do Oeste Potiguar – ICOP para, atualizado sobre a próxima empreitada, associar-me a eles, com prazer. É tomar alguma providência para a festinha de Nossa Senhora do Carmo.

É poder compartilhar da heterogeneidade da chamada geografia humana mossoroense, conversando e aprendendo com visões tão díspares como as de Paulo Linhares, Vilmar Pereira, Otávio Barra, Eduardo de Zé Agostinho, Alex Moacir ou do meu compadre Tertuliano Ayres Dias Filho, Tellzinho. É, enfim, entender as sábias e irreverentes “tiradas” de Paulo Lúcio.

Em Natal, a rotina é parecida. Gosto de caminhar no Parque das Dunas, conversando, entre outros, com Ricardo Espíndola e com Mário Marcelino. Também é prazeroso, nas manhãs de sábado, percorrer sebos e livrarias e encontrar, por exemplo, Manoel Onofre Júnior ― verdadeiro gentleman ― que, em alguns minutos, já nos fala de uma novidade livresca, boa e necessária.

É passar pelo salão Guedes, de onde, além de barbeados, saímos contagiados pela simpatia e pela espantosa jovialidade octogenária do próprio Antônio Guedes e, ainda, como souvenir, arriscar um reencontro com Ticiano Duarte, com Jorge Ivan Cascudo Rodrigues ou com José Bezerra Marinho, de inteligência e verve que nos transmitem a sensação de termos ganhado o dia.

Paulo de Tarso Correia de Melo e Ana Maria, Pedro Fernandes e Helaine, Damião nobre e Jailca sintetizam grandes amizades natalenses que Vilani, Alice e eu guardamos com carinho. Natal nos faz recordar a presteza e a acolhida de Artur e Eliete. Faz-nos relembrar igualmente das visitas dominicais à prima Verônica Rodrigues, sempre recheadas de afeição e de deliciosas iguarias. Natal é conversar com Edilson Pinto Júnior, Antônio Alfredo, Henrique Santana, Odúlio Botelho, Cláudia Rocha ou Carlos Newton Pinto, o gaúcho mais potiguar que conheço.

Outro dia, um amigo brasileiro, com esse jeito que nos é peculiar, em meio a elogios a Salamanca, pelos encantos que ostenta como cidade e como centro de estudos, saiu-se com uma muito boa:

― David, nosso único problema aqui é a travesia do “charco” (fazendo referência ao Oceano Atlântico), é muito custosa, e por isso não podemos “matar” nossas saudades quando nos dá vontade.

Respondi-lhe, contando aquela curiosa história da fauna nordestina em que o lagarto tejuaçu quando briga com a cobra não perde de vista o pé de pinhão para, sendo picado, sugar um pouco do “leite” da árvore, que lhe serve como antídoto, e, imunizado por algum tempo, poder voltar e lutar.

― Então, amigo, estamos longe, é verdade, por isso mesmo precisamos de férias para “realimentar as baterias” e voltar à batalha.



* Leia também Toponímia II
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David de Medeiros Leite (Mossoró-RN, 1966) é, sobretudo, apaixonado pelas terras potiguares. Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), é doutor em Direito Administrativo pela Universidade de Salamanca (Espanha), membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN), do Instituto Cultural do Oeste Potiguar (ICOP), da Academia Maçõnica de Letras do Rio Grande do Norte (AMLERN) e da Academia Mossoroense de Letras (AMOL). Dentre outros, é autor de: Companheiro Góis – Dez Anos de Saudade (2001); Ombudsman Mossoroense (2003); Incerto Caminhar (2009); e Cartas de Salamanca (2011). A presente crônica foi extraída de Cartas de Salamanca.


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