sábado, 6 de junho de 2015

ÁRIDOS EM NÓS MESMOS [Webston Moura]


Estructura I. Mixta/Madera. (1999) - Ángel Hernansáez


Tell-el-Kadi – Dissera-me daquela cidade, mas não muito. E ainda seria, entremeios, de nome Dan, outra designação, uma cidade multiplicada, antiga, cabendo em vários nomes. Tel Dan. Dissera-me, também, na carta, de um rio, o Jordão, rio que desce. Dissera-me, ainda, volto à carga, chamar-se Laís aquela cidade, qual seu nome (os olhos claros pareciam estar ali naquelas letras). E perguntei-me, no esconso da alma, o quão feminina poderia ter sido, em tempos já idos, Tell-el-Kadi. Abri a janela, os mapas nem tanto, e minha cidade, esta que já não habito e que, recíproca, não me habita, veio-me ao rosto: vento que um dia, supõe-se, soprara o de Laís (suas casas, seus anjos, seus olhos). Por que uma cidade, se mulher o for (e sempre o será?), há de nos causar comoção tão singular? Dissera-me possível um jardim imaginado ao pé de uma casa naquela cidade, onde, por também imaginação, luziam bailarinas Cyanella hyacinthoides, aquelas flores que merecem um salmo e que nascem noutro lugar, na África, não naquele árido de Dan. E outro lugar é sempre o estrangeiro que somos, terras áridas em nós mesmos, Tell-el-Kadi.

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MENSAGEM NA GARRAFA Creio dizer desta coisa a meus pés, uma concha, que me surge assim tão natural. E é manhã, setembro, pouco depois das 9h. E por que não pensá-la mais que coisa, haja vista o enorme fato de que significa exatamente pelo que nos fere ou nos alegra (ou outro sentimento que nos cause)? Súbito, ato do instante ― consciência ―, percebo esta xícara em minha mão (estás vendo a foto anexa?). É um milagre cada coisa que existe, uma onda no espaço ou um invento humano. Mas, o mundo, esta teia das nossas relações, anda oco. Curioso ver que o vasto pode ser oco. Mesmo dando nomes e funções a tudo, o fato é que exercitamos, e muito, uma perda de percepção. Quanto de vida existe à nossa volta? Esta é a pergunta. E esta concha, única, já não é mais trivial, já que a percebo com os olhos do estrangeiro que sou. Estamos juntos sob a mesma luz.


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Webston Moura é o editor do blog Arcanos Grávidos, além de co-editor de Kaya [revista de atitudes literárias]. Cearense de Morada Nova, mora em Russas desde 1988. Por formação, é Tecnólogo de Frutos Tropicais. Poeta, é autor de Encontros Imprecisos: insinuações poéticas (Imprece, 2006). Com o poema "A pronúncia da minha língua pela tua flor" e o conto "A vida carpida entre os dentes" participou da revista PARA MAMÍFEROS (Fortaleza, Nº 3, Ano 3, 2011). Com o poema "Enquanto o muçambê delira a meus olhos" participou da Revista do Instituto Cultural do Oeste Potiguar - ICOP (Nº 16, setembro de 2012). Teve ainda poema publicado no projeto Trânsito de Leituras. Aprecia teatro, desenho, boa música, além de questões ligadas a temas como meio ambiente, sustentabilidade, dentre outros. Colaborou tecnicamente com o blog Literatura sem fronteiras.



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